A escoliose assume-se como uma deformidade na coluna vertebral que dependendo da sua gravidade pode ter um impacto significativo na autoimagem e na qualidade de vida das crianças e adolescentes afetados.
Falamos de escoliose apenas quando o ângulo de Cobb é superior a 10º acompanhado de rotação horizontal das vertebras do ápex da curva, o que provoca a deformidade do tórax e a tão inestética “bossa”. Tendo em conta esta definição, ficam de fora todos os desvios posturais, habitualmente flexíveis e sem rotação, e a maioria dos desvios escolióticos de grande raio, termo que frequentemente vemos relatado nos exames radiográficos e que não deverá preocupar os clínicos e os pais. Dois a três por cento dos jovens com 16 anos, apresentam escoliose com um ângulo superior a 10° e menos de 1% apresentarão escolioses superiores a 40°.
Ao contrário do que seria de esperar, a ocorrência de dor na coluna sobrepõe-se à da população em geral sem escoliose, podendo em casos mais graves, haver compromisso parcial da função respiratória. Assim, quando um adolescente com escoliose apresentar queixas de falta de ar quando faz esforço, não se deve estabelecer de imediato a relação da deformidade com a dificuldade respiratória, mas sim, por exemplo, pensar na asma, como explicação para aquele sintoma.
Recentemente foi publicado um estudo que permitiu confirmar a eficácia dos coletes rígidos no tratamento conservador da escoliose. De facto, analisando os resultados do referido estudo, houve uma diminuição significativa das crianças a necessitarem de cirurgia quando o colete era utilizado num mínimo de 12 horas por dia. Esta informação, sendo extremamente útil coloca, contudo, um novo desafio que é o de selecionar o candidato ideal para a sua utilização, tendo em conta a dimensão da curva e o estádio de maturidade esquelética dos Jovens, sob pena de cairmos num excesso de utilização do colete sem qualquer indicação.
Para casos mais graves, normalmente com ângulo de Cobb superior a 50º, é comum propormos a cirurgia. Esta, mais uma vez, deve ser bem equacionada tendo em conta a maturidade esquelética do jovem e a deformidade presente. Podemos ter curvas com 50º, perfeitamente balanceadas que, num jovem no final do crescimento, poderão não necessitar de cirurgia, sem prejuízo para a qualidade de vida futura enquanto que a mesma curva, numa criança em crescimento, justificará seguramente a cirurgia.
O extraordinário avanço na técnica cirúrgica e nas tecnologias de fixação da coluna, têm feito com que a cirurgia de escoliose seja hoje realizada num ambiente de grande segurança, com uma taxa de complicações relativamente baixa e bons resultados clínicos. A instrumentação hoje aplicada, confere à coluna uma excelente estabilidade, permitindo ao doente um regresso rápido à vida ativa, com um pós-operatório menos doloroso.
Todavia, a recente evidência da eficácia dos coletes, relança de novo o interesse em diagnosticar a escoliose numa fase mais precoce, colocando o debate na indicação ou não de retomar os exames de rastreio escolar aplicados na adolescência. Em Portugal, essa responsabilidade poderá ficar perfeitamente entregue aos médicos de clínica geral e aos pediatras que, desde há muito tempo, seguem as crianças com esta preocupação. Porém, será vantajoso incluirmos também nesta equação, a participação dos pais, professores e educadores que, mediante um maior conhecimento sobre as manifestações da escoliose, poderão alertar mais cedo os clínicos, para o aparecimento da deformidade.
Há um ano, foi lançada a campanha “Josephine explica a escoliose” com o objetivo de sensibilizar e esclarecer as pessoas em relação à escoliose pediátrica, a principal deformidade da coluna em crianças e adolescentes. A campanha tem como embaixadora a girafa Josephine (Jo, para os mais pequenos) e conta com o patrocínio científico da Sociedade Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia (SPOT) e da Sociedade Portuguesa de Pediatria (SPP), com o apoio da Medtronic.
Pedro Fernandes
Ortopedista do Hospital de Santa Maria e coordenador da campanha “Josephine explica a escoliose”